VERÔNICA COMEÇA A TRABALHAR NA CASA DA FAMILIA DINIZ

- Eu estou viva, eu sou gente, eu existo.
A vontade era tão grande que eu chorava por qualquer motivo. Tentava buscar em meus clientes algum meio de sair daquela vida, mas nada havia para mudar o meu destino. Entre os meus clientes existia um homem chamado José Bastião da Silveira que a mais de um ano me visitava e pagava mais que era necessário. Ele um dia declarou o seu amor por mim e mostrou o desejo de deixar a sua mulher por mim e viajarmos juntos para a cidade Juazeinho. Mas eu não queria aquilo, ser feliz com a infelicidade alheia, eu não queria mesmo que aquela situação fosse desejada por todas as quengas que ali moravam. Ele insistia e sempre trazia um dinheirinho para mim como se já tivesse compromisso comigo. Era muito gentil e conhecia minha história desde que eu era gente, ou seja, moça. Para a sociedade da época parecia que eu tinha perdido a dignidade e a vida junto com o meu “cabaço”. Pedi a Bastião que conseguisse um trabalho para mim e ele se demonstrou disposto a isto. Em poucas semanas ele chega com um endereço para que eu trabalhe em casa de família. Fui até a referida casa próximo ao açude velho, lugar dos ricos da época. Era uma casa muito bonita e a família muito rica










Riacho das quengas – Joilson Assis 101


Por nome Queiroz. Era uma casa muito grande e tinha muitos objetos caros.
- Verônica é o seu nome não é?
- Sim senhora.
- Seu bastião enviou a senhora dizendo que o seu trabalho era de lavadeira do açude de Bodocongó. Certo?
- Sim senhora.
- Queremos que a senhora durma no serviço e limpe a casa, lave a roupa e faça comida junto com Benta minha empregada antiga. Vamos pagar a senhora 1 conto de reis por mês. A senhora poderá visitar sua família uma vez por mês e vossa mercês terá um quarto aqui nos fundos com banheiro individualizado. Ta certo?
- Sim senhora.
Que mulher firme ela parecia uma rainha com todo o império. Trouxe para casa dela as poucas roupas que tinha e dei as demais que não eram necessárias naquele novo ambiente. Aleluia, eu tinha encontrado o céu que há tanto tempo procurava. Eu já tinha quase dez contos de reis guardados, e era apenas questão de tempo para aumentar mais esta quantia












Riacho das quengas – Joilson Assis 102


E comprar a minha casa tão sonhadora. Finalmente tinha surgido grande chance da minha saída da casa das quengas e ser alguém da sociedade dos vivos.






















Riacho das quengas – Joilson Assis 103
Capítulo VI

Comecei a trabalhar na casa da família Diniz e a alegria não saia da minha face. Era uma casa linda, rica e era muito cheirosa. As pessoas daquela casa me tratavam muito bem, sempre pedindo por favor etc. Ah, eu era uma dama da sociedade dos vivos mesmo sendo uma simples empregada doméstica. Agora era apenas me educar e quem sabe não surgia um vigilante, um jardineiro para casar comigo. Graças a Deus e a Bastião eu tinha aquele lindo emprego. Ele me visitava de vez em quando e me trazia dinheiro e flores escondidas era um velhinho verdadeiramente simpático.
- Verônica, você está bem?
- Sim seu Bastião, estou muito bem graças ao senhor.
- Minha filha eu quero que você seja muito feliz e compre a sua casa e se um dia quiser ficar comigo para sempre basta chamar-me. Ta!
Será que aquele velho estava realmente apaixonado por mim? Ele tinha realmente me ajudado e o meu trabalho era um orgulho para mim. Eu era uma emprega doméstica com orgulho! Era uma grande realização para mim sair daquele ambiente aonde fui colocada. Passei vários meses em pleno sossego,












Riacho das quengas – Joilson Assis 104


Ajuntando meu dinheiro, mas infelizmente depois de ganhar a confiança de toda a casa e participar de suas festas e de sua mesa seu Diniz e seu filho passaram a demonstrar certa simpatia por mim. Além dos olhares os dois faziam de tudo para ficarem a sós comigo e isto acontecia todos os domingos pela manhã e a noite quando dona Diniz ia para a igreja com a sua serviçal fiel Benta. Os dois homens da casa de revezavam sem saber um do outro, em me seduzir. Eu não queria confusão, pois estava em plena realização, mas os dois insistiam então se juntavam a fome com a vontade de comer. Há meses eu estava distante de homens e bastava um leve toque para que eu me derretesse em desejos ardentes. Era uma tentação constante, mas eu estava disposta a resistir com todas as minhas forças. Todos ser que vive sobre a terra é contraditório e não existe nenhum ser que não se contradiga e às vezes o que está entre as nossas pernas domina o que esta sobre o pescoço, é uma verdadeira rebelião física. Beijos e amassos eu não consegui evitar e as mãos dos dois sempre amassavam na menor chance que tivessem. O pai e o filho os dois sem saber um do outro estavam tendo a mesma tara por mim, um desejo terrível por meu corpo. Eu não queria desagrada-los












Riacho das quengas – Joilson Assis 105


Mas eu não queria desagradar a patroa que tanto me considerava. Mas quem anda sempre na beira caba caindo no fundo! E foi o que exatamente aconteceu.
Em uma bela manhã de domingo eu cuidava da arrumação do quarto do casal quando seu Diniz entrou pela porta e disse que queria tomar banho.
- Vou tomar banho Verônica.
- Vou sair.
- Não, fique ai vou precisar de você.
Ele tomou o seu banho e saiu de toalha, desnudou-se em minha frente e mandou enxugar suas costas. Agarramos-nos como em uma briga e em prazeres nos afogamos naquela cama de cheiro maravilhoso e lençóis macios que pareciam me absolver de tão macios, de uma cor extremamente branca. Foi nesta cama que devoramos como dois famintos de amo. Parecia que vários pedaços iriam ser arrancados dos dois e o movimento de nossos corpos eram tão quentes que parecia que iria sair fumaça. Era uma loucura sobre aquela cama que tão limpinha foi manchada aos poucos com o nosso amor que respingava paixão por todos os lados. Aquele homem estava sedento e várias vezes inicia-










Riacho das quengas – Joilson Assis 106


Vamos aquela maratona do prazer o que nos deixou exaustos, quase em desmaios. Eu não queria aquela situação, mas ela veio com muita força e eu não consegui resistir.
Esta mesma situação aconteceu com o filho dele que insistiu muito para me possuir e em situação semelhante me entreguei ao prazer com ele também. Novamente eu estava sendo uma amante e o sexo que era tão bom me fazia sofrer e se colocava no meu caminho como uma pedra e eu sempre tropeçava nela. Mas como dizer não ao meu próprio patrão? E ao seu filho o que eu diria? Estarei eu sendo novamente quenga dos dois? Eu estava agora morando ao lado do Xíque açude velho
Aonde moravam os ricos da cidade de Campina Grande, mas eu não conseguia deixar de ser de homens que não eram meus. Dona Diniz com toda aquela autoridade de patroa sempre facilitava a minha estadia naquela casa a sós com seus dois homens, marido e filho, para minha surpresa os meses se passaram e ninguém percebeu a grande atividade sexual existente na ausência dela com seu esposo e filho. Nem mesmo os dois tomaram conhecimento do que o outro fazia. O filho de do-












Riacho das quengas – Joilson Assis 107


Na Diniz, Renato Lima Diniz era noivo de uma moça donzela da família Gaudêncio e era casamento certo. Era mais uma daquelas uniões que projetavam os dois para o futuro, mas enquanto a sua donzela permanecia pura aguardando o seu casamento, eu servia de amante para ele que em meus braços adormecia. As vezes eu tinha a impressão que Dona Diniz sabia do ocorrido no oculto dos lençóis, mas nada dizia, como se quisesse dar aos seus homens a oportunidade de estar comigo e desfrutarem uma nova mulher. Mas eu nunca tive certeza disto, mas sempre desconfiei, desconfiei mesmo. Era muito estranho principalmente quando ela viajava para a capital e passava lá alguns dias deixando os seus homens famintos de prazer justamente comigo eu era “comida” fácil para eles. Ela sempre levava Benta a sua serviçal de muitos anos e nisto os dois estavam nos meus braços por dois, três e até quatro dias de grande atividade. Era uma loucura!
As vezes os pobres são vítimas de suas próprias ignorâncias, pois expõem suas vísceras por qualquer motivo em nome de sua moral, de Deus ou de qualquer outra coisa semelhante. Já os riscos que eu convivi guardavam seus defeitos para resol-













Riacho das quengas – Joilson Assis 108


Verem entre paredes. Com palavras baixas quase ao pé dos ouvidos resolviam suas questões, mas os pobres “berravam” nas ruas o que aconteciam em suas casas. A moça que se “perdesse” naquele tempo entre os pobres era ridicularizada e uma grande parte delas acabava nas casas das quengas, mas entre os ricos este fato era ocultado até pelo noivo que percebia que sua esposa não era virgem. Em raros casos as moças xíques acabavam em um convento, santa e pura, mas suas vergonhas não eram expostas a todos. Moral sem misericórdia é pura hipocrisia e eu estava acabando de perceber isto. Meu pai não era um homem de moral, pois tinha várias quengas, batia na minha mãe e quis demonstrar moral em cima de meu erro isto impiedosamente me destinando ao submundo da sociedade. Depois que eu virei quenga ninguém da minha família tinha me visitado, nem os meus irmãos e irmãs que já tinham casado e organizado suas vidas. Para muitos de meus familiares eu tinha uma doença contagiosa e nem de longe desejavam me ver, talvez para eu não ir a casa deles. Eu tinha me tornado um LIXO DA SOCIEDADE DOS VIVOS E PARTICIPAVA DA SOCIEDADE DOS MORTOS. Mas graças












Riacho das quengas – Joilson Assis 109


A Deus ninguém da sociedade dos vivos tinha me conhecido naquela mansão dos Diniz. Nos meus horários vagos eu treinava a minha escrita e começava a escrever as minhas principais histórias. Esquecendo alguns detalhes eu estava me sentindo uma mulher da sociedade e até na mesa as vezes eu almoçava com a família que me acolhia. É claro que alguns pés debaixo da mesa me “cutucavam”, mas isto era apenas detalhe, apenas detalhe! Eu ajuntava dinheiro e já estava perto de conseguir o meu propósito de comprar a minha casa.

Nenhum comentário:

Postar um comentário