ANA CAROLINA SE TORNA VERÔNICA A QUENGA DO NORDESTE

Riacho das quengas – Joilson Assis 73







CAPITULO 1V








Existem alguns pesadelos que são vividos acordados que desejaríamos de todo o coração que fosse apenas um mau estar da noite. No dia que cheguei na casa das quengas chorei muito, muito mesmo e por alguns instantes fui acompanhada por outras que me assistiam que nem mesmo conhecia a minha história. Dona Yaýa foi muito paciente comigo e durante uma semana ela não tratou nada comigo apenas perguntava se eu estava bem. Tudo era úmido um leve cheirinho de fumaça das lenhas dos fogões, os lençóis tinha um leve cheiro de cigarro. Era muito diferente do ambiente que vivi toda a minha vida até os quinze anos. A noite havia música, danças e muitas gargalhadas como se toda noite houvesse festa. O quarto onde eu estava ficava ligado a vários outros quartinhos que eram utilizados pelos casais em seus amores não me deixando dormir com tanto “ais e uis” que se faziam toda noite pelas meninas e pelos homens que estavam com elas. Era algo que misturava excitação e medo, pois era um mundo











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Que eu não conhecia. Realmente durando a noite era difícil dormir com aquela movimentação toda, música e sons de prazer bem ao lado da minha cama. O reservatório de lagrimas secaram, mas as cipoadas ainda doíam um pouco mas a minha mente ainda estava conflitante pensando para onde eu iria fugir. Mas para onde eu iria? Todos notaram que meu pai me trouxe para o meio das quengas para proteger minhas irmãs de saber o que soube, nisto quem iria me aceitar?
- Tavares eu te amei tanto Cadê você!?
- Eu confiei tanto em tuas palavras e me entreguei em tuas mãos a minha vida e tu jogastes ao chão e pisastes em cima dela.
Pouco a pouco eu criava certa raiva do homem como se esta espécie fosse má. Em minha cama de quenga eu sonhava ainda ser uma senhora de honra e teu um homem só pra mim. Algumas vezes eu pensava que Tavares iria vim me tirar deste inferno em outras fugir sem destino, mas eu era tão nova para sair do destino que meu amado pai me colocou. A sua moral era supostamente maior que a sua filha que ele dizia que tanto amava. Os dois homens que tanto amei me jogaram na vida que dificilmente eu sairia. Moral sem misericórdia se torna hipocrisia pura, pois meu








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Pai se sentia atingido por um erro que fiz com um namorado que me enganou, mas não sentia a sua moral atingida quando todos comentavam as suas espadinhas com as quengas que tinha em vários lugares nem com as noitadas nos bordeis da região. Eu não compreendia isto; será que era porque idade não permitia? A contradição parecia habitar no coração do homem, o ser humano é um ser extremamente contraditório.
Durante o dia eu ficava junto as meninas, mas um pouco estranha a turma de mulheres que estavam ali. Elas cozinhavam muito bem e apesar de estar muito triste eu estava em conflito e não me enturmava, porém tinha uma fome muito grande. A noite eu me trancava no quarto, mas não conseguia dormir com tantos “ais e uis, uhhh, ahhh” que haviam e que pouco a pouco me excitavam também. Como os casebres havia buracos pequenininhos onde eu passei a observar as quengas seus trabalhos e o que via era uma tremenda loucura sexual. Eu nunca vi tanto sexo e em uma noite de sábado uma quenga chegava a nove, dez homem que “botavam pra quebrar” naqueles corpos na maioria jovens. Pelos buracos eu observava tudo e via os nobres que viviam em seus palanques se renderem a duas penas aber-









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Tas. Era a incrível contradição da sociedade da época. Ver o prazer dos outros excita mais que ter pessoalmente e prazer em uma semana eu já estava ardendo de desejo. Eu estranhei porque minhas regras não vieram e vomitei algumas vezes. Mas eu pensei que era por motivo de tanta excitação não atendida ou o fato que eu estava dormindo muito tarde da noite. Para minha surpresa dona Yaýa disse-me que eu estava “prenha” de “bucho” o que me fez novamente sofrer terrivelmente.
- Carol, você ta de bucho e é um bucho muito forte porque não abortasse mesmo com tanta surra e problemas.
Eu estava de bucho e não sabia o que fazer nem a quem recorrer. Realmente eu estava perdida ao lado da Mata de Dona America Correia e do major Juvino seu esposo. As lagrimas já não caia mais apenas o brilho do meu olhar era fraco como de uma semimorta para a sociedade dos vivos. Uma semana depois da entrega na casa de Dona Yaýa minha mãe me visitou, trouxe-me comida e frutas e chorou ao me ver e principalmente em saber que eu estava de bucho de Tavares.
- Minha filha eu te amo tanto e vou tentar arrumar um lugar para você ir. Você sabe como é o seu pai? Ele tem medo das








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Outras se tornarem assim como tu.
- Eu não morri mãe, eu só perdi a virgindade!
- Você minha filha tem que sustentar o erro que fez. Eu vou tentar conseguir uma casa nos sítios pra você ficar.
- Mãe por amor de Deus me tire deste inferno!
- Aguarde, eu vou tentar tirar você mas até lá obedeça a dona Yaýa. Eu te amo!
Da janela da casa das quengas observei a minha mãe indo embora com seu jeito de andar. Eu sabia que ela estava tentando muito me tirar dali, mas ela temia pelos meus irmãos e irmãs. Se o meu pai fosse embora ela teria muitas dificuldades para criá-los sem um homem. Aquela cabocla iria fazer de tudo para me tirar daquela prisão social, mas mesmo de poucos anos de vida eu sabia que era necessária muita força para isto. Talvez ela não conseguisse, mas eu a amava mesmo assim, ela era uma grande mulher.
Dona Yaýa procurou-me para ter uma conversa amiga.
- Carol, gostamos muito de você e as meninas parecem simpatizar com você. Mas alguns vão reclamar se você não fizer nada. Além








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De lavar pratos e roupas você necessitará de dormir com homens.
- Dona Yaýa estou buchada. Minha mãe vem me buscar e ainda acredito que Tavares venha me buscar justamente com seu filho.
- Mas enquanto isto não acontece você vai precisar trabalhar para não causar em algumas revoltas. Você vai ganhar dinheiro todo dia e eu vou alertar os homens para não te machucarem, pois “tu ta prenha”. Eu vou escolher você para os melhores homens que vierem aqui e bastará um ou dois por noite.
- Ta certo dona Yaýa.
- O seu nome vou omitir, pois se você sair ninguém vai lembrar.
O seu pseudônimo será VERÔNICA a partir de hoje.
Verônica passou a ser o meu nome e a primeira noite que fui para o salão de danças foi muito chocante. Aquela ambiente de pouca luz com aquela vitrola tocando música de “ruedeira” com aqueles homens de bigodes finos e perfumes fortes e olhares cortejantes, pareciam logos olhando para uma coelhinha, carne fresca a vista e de fácil acesso. Novamente me senti em um pesadelo terrível e sem forças para acordar de toda aquela situação.
Meio perdida ando pelo salão batendo nos casais dançantes e sem saber onde e o que fazer, de que forma sentar, em que lugar.
Em minha mente eu gritava! Tavares meu amor cadê você, cadê você meu amor? Meu pai me tire deste inferno meu pai, por favor!
- A jovem quer dançar?
- È... Agora não viu.

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- Dona Yaýa mandou eu convida-lo para dançar.
- Ta certo.
Começamos a dançar lentamente e enquanto aquele homem me levava o meu corpo a minha alma derretia dentro de mim descendo em meus olhos em forma de lagrimas. Abraçado bem juntinho ao meu corpo ainda de criança aquele homem nem mesmo percebia que as minhas lagrimas molhavam seus ombros e costas; mas ninguém percebia aquela angustia ou todos fingiam não ver. A música dizia: “Fingir você não sabe por que a dor que estás sentindo sabe que preferes morrer falaram mal de mim não quiseste acreditar agora pede clemência arrependida queres voltar. Agora é tarde hás de pagar o teu pecado, pois o amor fingido nunca deve ser perdoado.” Ao ouvir este letra eu chorava muito quase em agonia de morte, sem querer acreditar que eu era neste mundo que a poucos anos me recebeu uma QUENGA simplesmente quenga; sem vontade, sem lar, sem dono como um cão sem raça pedindo e sem ter ninguém que o assuma, dê comida e guarida para ele. Ah meu Deus que dor terrível! Quando as esperanças de uma pessoa morrem, toda pessoa morre junto com elas sem misericórdia alguma.
Eu só tinha visto um homem nu em minha frente que era Tavares, mas depois da dança não deu pra fugir e em um quarto pequeno e fedido me entreguei ao prazer com aquele homem que me fez delirar. Até me esqueci naquele momento que estava me tornando uma quenga do nordeste brasileiro. Soube depois que




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